A (In)coerência do Fogo

O desenho a fogo: os dedos e o sopro.
As pedras soltas suscitam algo,
uma textura sem segredo, aberta.
Como se não procurasse olho: sempre o deserto?

O corpo e essa onda, essa pedra - é uma linha
e o tumulto dos músculos no mar
eis o desejo da perda e do encontro
contra a parede, contra esta página
este deserto - o mar.

O sopro do incêndio da folhagem
esta rasura
no raso da inércia
ó apagada força amor do mar deserto força

reúno ou disperso pedras sobre o mar
ou pedras

Onde o corpo onde o desejo
perante o vento
a frágil força do corpo (aranha inerme?)?

Se eu soprar as vértebras do fogo aqui
se subverter a folha e nu gritar

Eu continuo com estas pedras no deserto - no mar?
Nem são pedras estas pedras mas a garganta
enfrenta o vento - e o deserto,
que corpo que corpo se perde ao rés da página
ou terra?

Mas se não fosse o deserto - se fosse a praia
a música do corpo
e o vento no mar
e o teu corpo no meu corpo?

Mas tu esperas três palavras
três pedras
- e sem o fogo sem a folhagem sem o mar

Se um signo fosse a coluna do sangue
perante a maré perante o fogo
e não a morte cega ao vento
este silêncio contra o peito?

Escrever assim mesmo com os ossos
com a proa no externo
com a proa no externo
com as sílabas deserto

Mas se o silêncio da praia - onde o mar? -
o silêncio da página
suscitassem essa música do corpo
aqueles membros brancos
vermelhos
em torno ao centro - e a respiração do mar?

Um braço, uma torção do braço pela violência do vento
um cântico na praia
o corpo contra o corpo amante amado?

Uma sílaba apenas verde ou branca
e não o torso musical
e não a pedra do mar o esplendor da praia?

Ninguém ouve o grito sobre o vento
sobre o ventre de ninguém
nada se ouve entre estas pedras
nada é aqui neste deserto

Mas isto é, isto é, com se
um signo
fosse o sangue da lâmpada?

Desenho as formas vivas na areua
desenho este sulco no meu corpo
soçobro sobre o sulco - em frente ao mar?

Que corpo se levanta? É um corpo, um outro corpo?
Um corpo que se ergue sobre a espuma
ou um sinal apenas sem o sangue?

A boca morde os dentes
a página está deserta
a praia está deserta.

A minha mão ergue-se num sinal vão
como se não desistisse.

As pedras nem são pedras
mas palavras
mas o desejo de um contacto incandescente
mas o ardor de um persistente insecto.

Praia, mar, sulcos na areia, vento
ou só deserto
eu vos invoco e vos insuflo a chama
da garganta,
eu apelo para o cântico. Caminho?

Mais do que a sílaba do mar
mais do que a flor imprevista
mais do que a sombra sobre o ombro
mais do que a sombra sobre o ombro
mais do que o ouro da areia
eu subscrevo o branco um novo corpo.
Ainda que nada veja senão as pedras
que delimitam o vazio
eu estou à beira de eu sou o intervalo
entre a folhagem e o fogo
e o silêncio é um sinal
do corpo.



Que diz a forma da pedra - o corpo?
Que diz este silêncio de erva?
Este punhal de feno no meu peito,
esta sílaba trémula, esta sombra fria,
que diz a cor do muro?

A terra tem aos ombros a folhagem
o mar ainda na distância
mas o clamor destes sinais proclama o animal
do fogo
os passos caminham entre as chamas e o apelo das ondas.

A terra é alta como o corpo e baixa
As casas cintiliam mas num contacto sólido
Em todas as estradas o sol caminha com os meus passos.

A folha é escrita como um paisagem
Ainda é o deserto e a noite é próxima!
Mas os sinais despertaram o lugar
onde o silêncio é a congregação da terra.


Escolho a clareira do corpo silencioso.


É um corpo que envolve o corpo.
Posso assinar o rosto deste corpo?
Os sinais sangram enfim e dizem terra.
Escrever é finalmente subscrever o ar
das ervas
e desenhar o sopro com os dedos: amar o corpo.
Amar. Dizer amar: amar o mar
na proximidade do próximo, no ombro
do teu corpo ou no parapeito da terra.

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